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Existe um tipo de “modalidade” de longa distância, até há pouco tempo desconhecido para mim, chamado de Fleche. Muito basicamente caracteriza-se por ser um percurso realizado em equipa com uma distância mínima de 360kms, percurso definido atempadamente pela equipa. Um tempo de 24 horas para ser realizado, independentemente da distância e o posto de controlo da 22ª hora tem que distar mais de 25kms do final. O espírito de equipa e entre ajuda é condição fundamental.
Foi uma agradável surpresa o convite para integrar a equipa que saiu de Lisboa nesta edição experimental.
Fui de comboio para a capital no dia anterior alojando-me em casa de um dos companheiros de viagem, o que muito convém por dois motivos: não existiam comboios a tempo de estar em Lisboa às 10 da manhã e a noite é melhor dormida. Tenho que voltar a agradecer a disponibilidade. Apanhei logo nas orelhas porque levei pouca roupa. O meu anfitrião começa num abrir de gavetas e num instante eu estava cheio de roupa suplente. O que mais me preocupou nessa noite foram as condições atmosféricas. Acordei à meia noite e pouco com um vendaval do caraças. Voltei a acordar às 7 e tal e ouvi os passarinhos, sinal de alguns raios de sol que confirmei na janela. Além disso sonhei a noite toda com o dia seguinte. A verdade é que quando finalmente me levantei o tempo tinha escurecido e a prometida chuva estava presente.
Ainda não eram 10 da manhã já estava no Terreiro do Paço a cumprimentar outro elemento da equipa e esperar pelo quarto. Entretanto toma-se o primeiro café do dia com uma manta pelos joelhos, sempre ajudou a tornar a partida mais aconchegante.
Depois da primeira carimbadela e fotografias metemos os capacetes à chuva por volta das 10:10. Foi a chuva que potenciou o primeiro azar do dia. Não sendo forte, foi a suficiente para tapar alguns buracos da estrada e um dos colegas espetou com a bicicleta dentro de um desses buracos. Pensei que tinha sido uma luz que se tinha desmontado toda no meio da estrada. Afinal foram só umas barras energéticas que caíram mas estávamos longe de imaginar o estrago feito pelo buraco. Primeiro um furo numa roda… depois afinal a outra também estava furada. Depois o travão traseiro não funcionava… mas porquê? Olha, o apoio do cabo está partido! Espera, o quadro está rachado! Ei, olhem aqui, o dropout partiu! Uma pancada violenta que mandou um quadro de carbono para o lixo. É verdade que o carbono não é o material mais indicado para carregar com apetrexos de touring mas a pancada foi mesmo muito violenta, não sei que estragos teria também um quadro de alumínio ou aço. Decidiu-se ir trocar a bicicleta. Num instante tirou-se o desviador e levou-se a acidentada em jeito de single speed. A pequena viagem de 5kms fez com que o quadro acabasse por rachar em toda a circunferência do tubo. Foi a sentença de morte final.
Depois de duas horas após o acidente andava-se a bom ritmo em direcção a Vila Franca de Xira. Assustado com a N10, estava a gostar do tempo que finalmente clareava e do ritmo a que rolávamos. Depressa chegaríamos a Porto Alto onde uma sopa e uma queijada constituíram a primeira refeição do dia.
A próxima paragem seria Mora, aos 120kms. Para lá chegar iríamos por estradas já conhecidas de BRMs ditos normais. O restaurante Afonso, já conhecido do BRM de 200kms de 2012, foi o local para mais um carimbo, uma sopa e um bolo de mel.
Apesar de desconfiar que tinha um furo muito lento, estava tudo a correr bem e recuperámos o tempo perdido com o acidente. Estávamos dentro dos tempos previstos ou pelo menos assim pensávamos. Arrancámos contentes em direcção à Barragem de Montargil. Um fim de tarde avassalador como só o Alentejo sabe dar, foi motivo mais que suficiente para deslizar as bicicletas e não nos preocupar-mos muito com a velocidade. A barragem foi mais um motivo para uma paragem. Mas depois o chefe de equipa alertou “estamos atrasados”… porra! Dali até Ponte de Sor foi um trabalho de equipa na medida do possível, onde cheguei à conclusão que não sou muito bom a puxar… acabo por acelerar quando vou à frente em vez de manter uma velocidade estável.
Ponte de Sor, 160kms percorridos. Hora de encher os sacos com mantimentos para a noite e procurar um restaurante para jantar. Os mantimentos foram obtidos no supermercado e compostos por pão, sumos, fruta, bolos e mais umas quantas coisas. O difícil foi enfiar tudo nas malas. O jantar ficou a cargo de um tal de restaurante Padeiro. Quase que não o víamos e se não fosse eu gritar “é aqui” tínhamos perdido um belo jantar. Bacalhau com castanhas, camarões e queijo acompanhado por uma salada de agrião com laranja e uma mousse de chocolate fantástica foram o combustível para a noite. Apesar do restaurante estar cheio fomos servidos com relativa rapidez e teve um custo em conta, em parte por rejeitarmos as entradas, creio eu.
Mesmo assim, demorámos duas horas! Isto contando com o tempo gasto a vestir a roupa para a noite. Ah, afinal tinha mesmo um furo lento. Quando fui trocar a câmara reparei que tinha levado uma câmara de roda 20. Jogada de génio! Como encontrei logo o furo, não pedi nenhuma aos meus colegas e foi altura de experimentar os remendos rápidos. Aprovados!
A partir daqui começa a parte mais acidentada do percurso e sem grande margem para recuperar tempo. Esta paragem de duas horas havia de acabar por custar caro. Abrantes, 30kms depois do jantar, tem uma subida “filha da mãe” compensada por uma descida generosa.
Daqui a Tomar o que não faltaram foram subidas e descidas envoltas num nevoeiro engraçado. Felizmente a noite não se colocou demasiado fria. Apesar da chuva, Tomar é um belo sitio para lanchar qualquer coisa. Mais uma vez acabou-se por se demorar mais do que podia-mos.
Se não estou em erro, foi de Tomar para Ourém que nos ia-mos perdendo. Com a ajuda do GPS, lá demos com a estrada e mais subidas e descidas. Para mim existia uma etapa psicológica chamada Leiria. Ou melhor, Ortigosa e essa meta estava perto. Infelizmente, quando lá chegámos, ao km 280 já estavamos bastante atrasados, no limite do que seria a média real para completar o percurso com sucesso dentro das 24 horas. Não deu tempo para mais do que comer e abastecer de água.
O dia estava a nascer e a partir daqui seria N109, para mim uma das últimas oportunidades para ganhar tempo. Estranhamente, achei-nos a andar devagar nesta estrada, talvez muito por culpa de uma brisa frontal em direcção à Figueira da Foz. O GPS acabou por se passar na Figueira mas eu sabia o caminho para Montemor e acabei por acertar no percurso pré definido. O problema é que as rectas rolantes da 109 dão lugar a mais subidas! Isto fez com que a chegada a Montemor-O-Velho fosse feita com um sprint para chegar dentro da 22ª hora. Não havia tempo a perder nem poderia-mos parar e descansar. Já só tinha-mos uma hora para chegar a Coimbra. Fiquei de avisar o grande entusiasta de bicicletas antigas organizador do passeio de Verride e acabei por não o fazer, primeiro, porque não posso usar o telemóvel com chuva, segundo porque fiquei sem bateria. Tenho que pedir desculpa por isso, até porque foi ele que nos orientou os carimbos na pastelaria Anjo Doce.
O caminho para Coimbra não tem muito para contar. Afinal os 360kms foram ultrapassados um bocado antes do ponto de chegada e acabámos por atingir o mesmo já uns minutos depois das 10:00. O pequeno café situado ao lado da Ponte de St. Clara foi o ponto final da aventura. Um bem haja para o proprietário da maior colecção de garrafas miniatura da Europa que nos acolheu com um sorriso e boa disposição que bem merecia-mos. A quilómetragem real situa-se quase nos 400kms. Não interessa. O que interessou foi a viagem, a experiência e o que aprendi, a bagagem que levo para um dia, quando isto tudo já não for uma experiência, conduzir o meu grupo.
Infelizmente a equipa do Porto ficou por Viseu. As condições atmosféricas aliadas a uma altimetria algo bravia ditaram o fim de uma aventura que deve ter sido muito mais dura que a nossa. Afinal, se nós tivemos cerca de 3500m de acumulado, eles não deveriam ter menos de 6000m. É de homem!
O almoço foi servido no restaurante Itália, à base de massas, com boa vista sobre o rio Mondego e, mais importante, sobre as bicicletas! Curiosamente choveu muito mais durante o almoço do que durante o percurso. Aliás, se analisarmos o tempo que fez antes e depois da aventura, até podemos dizer que a sorte andou do nosso lado. Fotografias em andamento não é comigo, por isso vou ter que esperar por quem as tirou 🙂
O regresso foi feito de comboio. Como optei por usar a linha do Oeste, despedi-me dos meus colegas em Coimbra. Apanhei o primeiro quim para a Bifurcação de Lares, onde dormi cerca de uma hora ao sol, apenas com o som do vento e da passarada por companhia. Apenas um pormenor que para mim é importante.