Ainda nem tinha saído de Portugal e já estava com problemas. Tinha marcado o voo para bem cedo pois caso algo viesse a correr mal, teria tempo mais que suficiente para resolver eventuais problemas. Ora, o voo atrasou umas cinco horas. Entre esperar pela bagagem e montar a bicicleta, acabei por passar a maior parte do dia em aeroportos. Ora, como um azar nunca vem só, quando enchi os pneus reparei que um deles estava a deixar escapar ar pela válvula. Oh diabo. É que estava com pneus tubeless e tinha pensado ‘oh compro camaras de ar na Bélgica’. Pois. Caminhei até à loja mais próxima que o mapa mostrou e tinha fechado fazia cinco minutos. O mesmo estava a acontecer com as outras. Perguntei a umas pessoas que encontrei numa garagem se não havia nenhuma loja mais perto. Não mas depois de algumas invenções para tentar resolver o assunto telefonaram a um amigo ciclista que podia vender camaras de ar. Deixei a bicicleta na garagem dos senhores e fomos de carro dar uma voltinha. Voltei, instalei a camara de ar, agradeci (não quiseram nada pelo trabalho, fiquei de enviar um postal), e fui à minha vida.
Com estas voltas todas, o outro participante e amigo português já tinha chegado e montado a bicicleta no aeroporto, onde acabei por voltar para o apanhar. Não havia muito mais a fazer naquele dia a não ser jantar e ficar mesmo alojados em Bruxelas. Assim foi e a nossa anfitriã foi de uma simpatia e curiosidade extremas. O plano original era ficar alojado mais próximo do ponto de partida mas naquela altura não pareceu boa ideia.
O dia seguinte serviu apenas para percorrer a pequena distância entre o nosso alojamento e a cidade de onde começa a aventura, tratar de formalidades e esperar.
Vamos à massa! Infelizmente a massa que um estabelecimento local faz propositadamente para esta altura tinha acabado, devíamos ter ido um bocadinho mais cedo. Tivemos que forrar a barriga com outra coisa qualquer. Não foi importante, a excitação de ver tudo a acontecer nem deixava ter fome.
Eram 21:30 quando subimos para a praça que serve de ponto de partida para esta magnifica aventura. Mais um café para preencher o tempo de espera, que acompanha a admiração pelos outros participantes e respectivas máquinas. A partida sobe uma estrada de paralelo extremamente inclinada, ladeada por espectadores que se divertem a incentivar a confusão de bicicletas que se gera e devido à qual é necessária alguma perícia e equilibrismo para subir aquilo, mais que força. É uma pequena volta neutra, antes de soltar os ciclistas no seu ambiente selvagem. Fiz uma paragem de dois minutos para absorver que aquilo estava realmente a acontecer e realmente parti.
De Bélgica a Alemanha, ciclovias não são para gente com pressa.
Fui iludido pelas ferramentas online. A capacidade de traçar caminhos “para bicicleta” não significa que sejam caminhos de alcatrão para quem está com pressa. A verdade é que não tive muito cuidado a traçar esses caminhos. Também é verdade que tenho alguma capacidade ir de mapeando novos trajectos de forma rápida enquanto me desloco, mas não demorou muito até estar no meio de campos de batatas. Ainda assim, alguns desses caminhos, de gravilha ou terra batida junto ao canal onde várias casas-barco se alinhavam, foram um começo perfeito para a jornada, numa noite amena e despreocupada. A primeira paragem da madrugada foi, se não estou em erro, na Holanda, para tomar um pequeno almoço com ovos cozidos e quiches, que por sorte uma muito bem composta pastelaria tinha. Aliás… as pastelarias todas eram bem compostas e isso é um grande ponto positivo.
No entanto, já dentro da Alemanha, cheguei a um ponto que a confusão que se estava a gerar em torno destes caminhos era demasiada e o tempo perdido estava-me a deixar frustrado. Está bem que é muito giro andar no meio de vinhas mas eu queria só ir para a Grécia. Liguei o gps para me levar dali para fora, evitando autoestradas, e segui o aparelho cegamente. A Alemanha surpreendeu-me pela negativa. Não o país em si, mas o comportamento dos condutores, agressivos, perigosamente rápidos e pouco respeitadores dos semelhantes seres humanos na estrada. Por estes motivos dormi a minha primeira noite numa estação de autocarro, mais cedo do que esperava. Não estava a gostar dos automóveis naquela noite, provavelmente dirigidos a festas e discotecas ou vindos de lá.
Antes de subir para o primeiro posto de controlo… queria uma coca cola. Só consumo esta bebida com fins medicinais, mas naquele momento simplesmente apetecia-me. Procurei na vila e a única esplanada apetecível que encontrei era de uma classe e estilo irrepreensível. A bebida custou-me perto de 4€ e quando paguei com uma nota de 10€ ou 20€, não me lembro, a menina vestida com traje típico perguntou-me quanto queria pagar. Fiquei meio estúpido, mas rapidamente percebi que esperava gorjeta, o que obviamente não aconteceu, e lá arranjou o troco certo ao Português.
A subida obrigatória é, como não podia deixar de ser, muito inclinada e penosa. Ainda assim, de todas talvez tenha sido a mais fácil e até que não foi uma dor de cabeça muito grande chegar ao Castle Liechtenstein. Cheguei ao CP1 de bom humor e fiquei o resto da tarde, jantei e acabei por dormir na esplanada do hotel, debaixo de uma mesa, embrulhado no saco cama. Iria sair cedo para atacar a bela subida que bem sabia que me esperava, em direcção ao sul da Alemanha e por sua vez aos Alpes.
Toda a aventura até à Grécia só foi possível graças ao apoio da LaRedoute Portugal, Tomazzini Bicicletas e Bicimax aos quais tenho que agradecer a confiança depositada.